domingo, 7 de março de 2010

Durante os vinte anos que leccionei em Portugal, nos primeiros cinco anos andei à procura com uma “lanterna acesa” para encontrar um curso de Mestrado que viesse de encontro aos meus desejos. Desejos de novidades, de aquisição e renovação de conhecimentos, de troca de saberes, de envolvimento no meio de cultura académica, de progressão pessoal e profissional. Numa fase seguinte, deixei de procurar, mas nunca de sonhar com essa possibilidade. Um dia haveria de encontrar.
Em 2007, quase que sem me aperceber veio até às minhas mãos este curso de Mestrado. ISCTE, nada me era familiar. O curso, este sim, imediatamente me chamou a atenção. Instintivamente percebi que chegara a hora.
Sem vacilar, concorri. Carta de apresentação era um dos requisitos para a candidatura. Ao fazê-la, sentia que seria aprovada.
Como vivo intensamente cada momento em minha vida, foi com alegria que recebi a informação que fora aceite a candidatura. Tinha consciência do quanto seria difícil conciliar o trabalho e o Mestrado, talvez não na sua totalidade. Afinal acabara de sair de uma coordenação de escola que havia “sugado meu sangue”. Estava ainda em convalescença. Mas como deixar de aproveitar a oportunidade de realizar um sonho antigo. Cada dia de aula, cada trabalho “sabia” a recompensa pelo esforço e a certeza de que tudo valia a pena. Rejuvenesci e renovei-me.
Sabia, à priori, que custasse o que custasse, iria desdobrar-me para dar o meu melhor. Assídua, sorvia os conhecimentos (Kolb). Empenhei-me com a dedicação que me é peculiar.
Tal como procedo no meu trabalho, vivo este Mestrado com intensidade cada dia (como mencionei na minha carta de apresentação). Penso concluí-lo, mesmo estando a enfrentar uma “tempestade” na vida pessoal. Cada unidade curricular trouxe algo de novo, em carácter de complementaridade. Tentei aproveitar o quanto pude. Vou perseguir este “sonho”, que se tornou realidade, até o fim. Sinto que quero mais, que estou numa fase íntima ideal para me dedicar ao estudo.
“Experencia a afirmação de identidade entre múltiplas responsabilidades e pratica o compromisso como uma actividade que se desenvolve ao longo da vida e que é expressão de uma forma de ser” (Perry).
Os cursos que fui fazendo no percurso da minha carreira conferiram valores ao meu currículo pessoal e profissional, porém o Mestrado tem sido um elemento dinamizador de auto-reforma dos conhecimentos e capacidade de produção de conhecimento.
É nessa linha que quero seguir. Avançar a cada dia. Saber hoje, mais do que ontem. Uma eterna aprendente. O que o Mestrado poderá me trazer no futuro?
O futuro o dirá.
“Há uma relação entre a alegria necessária à actividade educativa e a esperança. (...) Na verdade, do ponto de vista da natureza humana, a esperança não é algo que a ela se justaponha. A esperança faz parte da natureza humana. Seria uma contradição se, inacabado e consciente do inacabamento, primeiro, o ser humano não se inscrevesse ou não se achasse predisposto a participar de um movimento de busca e, segundo, se buscasse sem esperança” (Freire, 2006).
Depois de dezasseis anos em Portugal, mais uma reviravolta. O tempo passou. Não pude deixar de perceber que aquela “missionária” do ensino, que tinha como bandeira levar o seu contributo para onde mais necessitassem, começou a estabilizar, a criar raízes numa mesma escola (quatro anos).
A mudança se fazia necessária. Circunstâncias de ordem familiar culminaram na necessidade de uma decisão. Deixar tudo para trás e seguir rumo a Lisboa, mais precisamente Cascais.
Concorri “no escuro”, a espera do veredicto. Escola nº3 de Alcoitão em Alcabideche. Para mim tudo queria dizer nada. Fui a procura. De imediato levei um susto. O que havia feito?! Afinal o que andava a fazer por mim mesma?!...
Ultrapassando essa fase, apresentei-me na escola. Novamente ninguém me conhecia. Confesso que me sentia já um pouco cansada de tanto fazer em todo lado e ter sempre que recomeçar da estaca zero. Mas fui eu a escolher. Respeitei. Com afinco iniciei uma nova jornada.
No final do primeiro ano nessa escola, a leccionar o primeiro ano de escolaridade, o único que havia quando cheguei, fui confrontada com uma situação que não havia como descartar. A então coordenadora se dizia cansada, sem condições físicas, mentais, psíquicas e emocionais para dar continuidade. Veio falar comigo que eu seria a pessoa indicada para assumir o cargo. Lancei mão de todas as formas para a convencer do contrário, inclusivé que faria tudo como havia feito nesse ano para a ajudar mas que preferia não ficar a exercer o cargo. Sentia que a escola era ela, dela e que seria difícil ser eu a administrar à minha maneira. O facto da colega estar, na altura há onze anos nessa escola, ter um passado com muitas histórias, viver a escola de forma tão pessoal, resisti a aceitar. Sabia que não conseguiria seguir a sua metodologia de trabalho e que não seria fácil mudar. Mas nada adiantou. Feita a eleição. Fui eleita por maioria. Nada mais podia fazer. Tive que me conformar.
Em dois anos de coordenação muitas histórias tenho para contar. Dezoito projectos foram postos a funcionar, alguns deles passaram a ser a minha “menina dos olhos”, como a “Adopção do Avô (ó)” por cada turma. Os “avós” e os “netinhos” desfrutaram de actividades conjuntas, participaram nos eventos, passeios, visitas de estudo, aulas, dinâmicas diversas, visitas ao domicílio.
Foram momentos intergeracionais únicos: de amor, respeito e percepção do valor de cada fase da vida do homem. O Lar da Terceira Idade da Santa Casa de Misericórdia e a Escola fazem, felizmente até a data, uma parceria de sucesso.
O Projecto: “Lanche Escolar” foi conseguido graças à parceria da Câmara Municipal de Cascais e Santa Casa, que nasceu da convicção de tudo ser possível e, no decorrer de uma reunião à qual enfatizei a necessidade das crianças terem diariamente um lanche diário colectivo, o projecto tornou-se realidade. Refiro que durante esses dois anos, as crianças aprenderam a comer fruta e a ter uma alimentação saudável e equilibrada. “Crianças saudáveis são crianças mais felizes”.
Poderia enunciar todos os outros projectos desenvolvidos, mas prefiro dizer que embora tenha me lançado numa façanha quase impossível de levar até o fim, de nada me arrependo e sinto que valeu cada sacrifício e todas as horas das noites não dormidas.
A maior de todas as provas não tem a ver com trabalho, mas sim com o relacionamento humano. Essa sim é a maior de todas as façanhas.”Não é no silêncio que os homens se fazem, mas na palavra, no trabalho, na acção-reflexão (...) o diálogo não pode reduzir-se a um acto de depositar ideias de um sujeito no outro, nem tampouco tornar-se simples troca de ideias a serem consumidas pelos permutantes, mas deve ser um acto de criação” (Freire, 1980). Numa política democrática, onde nada era feito sem conhecimento, opinião e aval do corpo docente, gerir essa escola passou a ser um teste probatório diário.
Aprendi muito, principalmente a confirmar o que já receava, que as pessoas resistem às mudanças, retaliam, boicotam as ideias que não tenham sido geradas nas suas mentes, dificultam um processo inovador de atingir sucesso. Percebo que a capacidade de gerir os recursos humanos ainda passa pelo poder de autoridade que lhe é conferido pelo cargo e pela estrutura hierárquica que o suporta. Hoje, olho para trás e vejo como o efeito da avaliação de desempenho do pessoal docente já se faz sentir, pela mudança de comportamentos.
Mas mesmo resistindo a “ventos e tempestades”, a nau singrou marés e chegou a bom porto.

quarta-feira, 3 de março de 2010

aprendiz da vida

a cada dia que passa olho a vida como uma menina que anda à procura de si mesma... sentindo a força da temporalidade fugir entre meus dedos... mas ávida por fazer...fazer...fazer mais, sem saber bem o quê?!
Olho para o passado e vejo uma vida vivida, o presente a ser vivido com ânsia de viver, de modo intenso, procurando achar sentido e o futuro como um sopro do vento...
O que vim cá fazer?! qual o meu sentido de vida hoje? Eterna aprendiz... sonhando acordada com uma vida ideal. Qual? aquela que eu possa encontrar PAZ DE ESPÍRITO!

terça-feira, 2 de março de 2010

Na passagem pra outra margem

Vinte anos se passaram. A caminhada continua, mais uma vez para o outro sentido da auto-estrada da minha vida.

“E as memórias escorrem do pescoço,
Do paletó, da guerra, do arco-íris;
Enroscam-se no sono e te perseguem,
a busca de pupila que as reflita”.


Drummond

Mestrado: Finalmente Encontrei o que tanto desejava

Durante os vinte anos que leccionei em Portugal, nos primeiros cinco anos andei à procura com uma “lanterna acesa” para encontrar um curso de Mestrado que viesse de encontro aos meus desejos. Desejos de novidades, de aquisição e renovação de conhecimentos, de troca de saberes, de envolvimento no meio de cultura académica, de progressão pessoal e profissional. Numa fase seguinte, deixei de procurar, mas nunca de sonhar com essa possibilidade. Um dia haveria de encontrar.
Em 2007, quase que sem me aperceber veio até às minhas mãos este curso de Mestrado. ISCTE, nada me era familiar. O curso, este sim, imediatamente me chamou a atenção. Instintivamente percebi que chegara a hora.
Sem vacilar, concorri. Carta de apresentação era um dos requisitos para a candidatura. Ao fazê-la, sentia que seria aprovada.
Como vivo intensamente cada momento em minha vida, foi com alegria que recebi a informação que fora aceite a candidatura. Tinha consciência do quanto seria difícil conciliar o trabalho e o Mestrado, talvez não na sua totalidade. Afinal acabara de sair de uma coordenação de escola que havia “sugado meu sangue”. Estava ainda em convalescença. Mas como deixar de aproveitar a oportunidade de realizar um sonho antigo. Cada dia de aula, cada trabalho “sabia” a recompensa pelo esforço e a certeza de que tudo valia a pena. Rejuvenesci e renovei-me.
Sabia, à priori, que custasse o que custasse, iria desdobrar-me para dar o meu melhor. Assídua, sorvia os conhecimentos (Kolb). Empenhei-me com a dedicação que me é peculiar.
Tal como procedo no meu trabalho, vivo este Mestrado com intensidade cada dia (como mencionei na minha carta de apresentação). Penso concluí-lo, mesmo estando a enfrentar uma “tempestade” na vida pessoal. Cada unidade curricular trouxe algo de novo, em carácter de complementaridade. Tentei aproveitar o quanto pude. Vou perseguir este “sonho”, que se tornou realidade, até o fim. Sinto que quero mais, que estou numa fase íntima ideal para me dedicar ao estudo.
“Experencia a afirmação de identidade entre múltiplas responsabilidades e pratica o compromisso como uma actividade que se desenvolve ao longo da vida e que é expressão de uma forma de ser” (Perry).
Os cursos que fui fazendo no percurso da minha carreira conferiram valores ao meu currículo pessoal e profissional, porém o Mestrado tem sido um elemento dinamizador de auto-reforma dos conhecimentos e capacidade de produção de conhecimento.
É nessa linha que quero seguir. Avançar a cada dia. Saber hoje, mais do que ontem. Uma eterna aprendente. O que o Mestrado poderá me trazer no futuro?
O futuro o dirá.

Aprender exige alegria e esperança

“Há uma relação entre a alegria necessária à actividade educativa e a esperança. (...) Na verdade, do ponto de vista da natureza humana, a esperança não é algo que a ela se justaponha. A esperança faz parte da natureza humana. Seria uma contradição se, inacabado e consciente do inacabamento, primeiro, o ser humano não se inscrevesse ou não se achasse predisposto a participar de um movimento de busca e, segundo, se buscasse sem esperança” (Freire, 2006).

Do Norte para Lisboa: Novo Desafio na Coordenação da Escola do Bairro da Cruz Vermelha

Depois de dezasseis anos em Portugal, mais uma reviravolta. O tempo passou. Não pude deixar de perceber que aquela “missionária” do ensino, que tinha como bandeira levar o seu contributo para onde mais necessitassem, começou a estabilizar, a criar raízes numa mesma escola (quatro anos).
A mudança se fazia necessária. Circunstâncias de ordem familiar culminaram na necessidade de uma decisão. Deixar tudo para trás e seguir rumo a Lisboa, mais precisamente Cascais.
Concorri “no escuro”, a espera do veredicto. Escola nº3 de Alcoitão em Alcabideche. Para mim tudo queria dizer nada. Fui a procura. De imediato levei um susto. O que havia feito?! Afinal o que andava a fazer por mim mesma?!...
Ultrapassado essa fase, apresentei-me na escola. Novamente ninguém me conhecia. Confesso que sentia-me já um pouco cansada de tanto fazer em todo lado e ter sempre que recomeçar da estaca zero. Mas fui eu a escolher. Respeitei. Com afinco dei inicio a uma nova jornada.
No final do primeiro ano nessa escola, a leccionar o primeiro ano de escolaridade, o único que havia quando cheguei, fui confrontada com uma situação que não havia como descartar. A então coordenadora se dizia cansada, sem condições físicas, mentais, psíquicas e emocionais para dar continuidade. Veio falar comigo que eu seria a pessoa indicada para assumir o cargo. Lancei mão de todas as formas para a convencer do contrário, inclusivé que faria tudo como havia feito nesse ano para a ajudar mas que preferia não ficar a exercer o cargo. Sentia que a escola era ela, dela e que seria difícil ser eu a administrar à minha maneira. O facto da colega estar, na altura há onze anos nessa escola, ter um passado com muitas histórias, viver a escola de forma tão pessoal, resisti a aceitar. Sabia que não conseguiria seguir a sua metodologia de trabalho e que não seria fácil mudar. Mas nada adiantou. Feita a eleição. Fui eleita por maioria. Nada mais podia fazer. Tive que me conformar.
Em dois anos de coordenação muitas histórias tenho para contar. Dezoito projectos foram postos a funcionar, alguns deles passaram a ser a minha “menina dos olhos”, como a “Adopção do Avô(ó)” por cada turma. Os “avós” e os “netinhos” desfrutaram de actividades conjuntas, participaram nos eventos, passeios, visitas de estudo, aulas, dinâmicas diversas, visitas ao domicílio.
Foram momentos intergeracionais únicos: de amor, respeito e percepção do valor de cada fase da vida do homem. O Lar da Terceira Idade da Santa Casa de Misericórdia e a Escola fazem, felizmente até a data, uma parceria de sucesso.
O Projecto: “Lanche Escolar” foi conseguido graças à parceria da Câmara Municipal de Cascais e Santa Casa, que nasceu da convicção de tudo ser possível e, no decorrer de uma reunião à qual enfatizei a necessidade das crianças terem diariamente um lanche diário colectivo, o projecto tornou-se realidade. Refiro que durante esses dois anos, as crianças aprenderam a comer fruta e a ter uma alimentação saudável e equilibrada. “Crianças saudáveis são crianças mais felizes”.
Poderia enunciar todos os outros projectos desenvolvidos, mas prefiro dizer que embora tenha me lançado numa façanha quase impossível de levar até o fim, de nada me arrependo e sinto que valeu cada sacrifício e todas as horas das noites não dormidas.
A maior de todas as provas não tem a ver com trabalho, mas sim com o relacionamento humano. Essa sim é a maior de todas as façanhas.”Não é no silêncio que os homens se fazem, mas na palavra, no trabalho, na acção-reflexão (...) o diálogo não pode reduzir-se a um acto de depositar ideias de um sujeito no outro, nem tampouco tornar-se simples troca de ideias a serem consumidas pelos permutantes, mas deve ser um acto de criação” (Freire, 1980). Numa política democrática, onde nada era feito sem conhecimento, opinião e aval do corpo docente, gerir essa escola passou a ser um teste probatório diário.
Aprendi muito, principalmente a confirmar o que já receava, que as pessoas resistem às mudanças, retaliam, boicotam as ideias que não tenham sido geradas nas suas mentes, dificultam um processo inovador de atingir sucesso. Percebo que a capacidade de gerir os recursos humanos ainda passa pelo poder de autoridade que lhe é conferido pelo cargo e pela estrutura hierárquica que o suporta. Hoje, olho para trás e vejo como o efeito da avaliação de desempenho do pessoal docente já se faz sentir, pela mudança de comportamentos.
Mas mesmo resistindo a “ventos e tempestades”, a nau singrou os marés e chegou a bom porto.

A Caixinha de Surpresas

Como saber o que dela sairá?
Arrisquei. Mais uma vez me propus a abri-la...
Deixei para o universo o poder de decisão.
Ao abri-la... num gesto elevei as mãos a cabeça e
pensei: “não é possível, mais uma vez vou ter que provar
tudo a todos e começar tudo de novo”!...

Assessora do Conselho Executivo: A pluridimensionalidade de funções, abrangência a toda a comunidade educativa

Onze anos se passaram. Ano de 2001. Nessa fase de minha vida sentia a necessidade de uma viragem direccional para novos horizontes. Comecei a idealizar levar a minha mensagem dos valores morais, éticos e de cidadania, bem como contribuir para o sucesso escolar dos alunos. O desejo nasceu, cultivei no meu pensamento. Passado pouco tempo, germinou. A oportunidade fora criada pela energia do pensamento. Na escola que leccionava, surgiu a vaga para Assessora do Conselho Executivo. Decorria o início do ano lectivo de 2001/2002, ainda na altura de Agrupamento Horizontal. Sem saber explicar bem como, surgiu a hipótese. Num ápice, e como era meu desejo uma mudança, propus à Presidente Executiva do Agrupamento a minha intenção de preencher essa vaga, propondo um Projecto de Escola elaborado, coordenado e ministrado por mim com a abrangência central de Aulas de Educação Pessoal, Moral e Cívica (nunca foi minha intenção estar imbuída a ideia de Educação Religiosa), Dinamização da Biblioteca, Centro de Recursos a alunos e professores, Assembleia de Escola e todas as actividades e eventos calendarizados para o ano lectivo. Com a conotação de Educação Religiosa transmitir-se-ia a ideia redutora de “catequese” na escola, ou outras variantes que não fariam sentido perder tempo a tentar perceber as ilações e /ou controvérsias relacionadas com o tema e ao que levaria as pessoas a conjecturar sobre a dimensão religiosa, não sendo esta nunca a minha intenção. Entretanto, no início, foi necessário contornar habilmente essa situação, porque a Presidente do Conselho Executivo insistia na ideia que deveria se acrescentar “Educação Religiosa” ao nome da disciplina, até porque a colega que iria ministrar essas aulas no período da manhã era uma pessoa ligada a Igreja Católica e numa de uniformizar procedimentos anuí, visto que isso em nada iria mudar o meu objectivo principal e procedimento pedagógico/didáctico. O Projecto que, em príncipio era para um ano lectivo, perante o sucesso do mesmo, teve a duração de dois anos lectivos.
No primeiro ano, o nome ficou de acordo com a vontade da Presidente do Conselho Executivo, i.e., Educação Pessoal, Moral, Cívica e Religiosa. No segundo ano, devido a circunstâncias alheias ao Projecto em referência, a sociedade passa a falar sobre factos ocorridos em escolas francesas com a proibição de qualquer símbolo religioso dentro das escolas e, mediante polémica gerada nos meios de comunicação social (inclusivé com a opinião do Presidente da República), ressurgiu a proposta que as escolas deveriam permanecer com a sua característica laica. Assim, o Projecto passou a ter a nomenclatura que eu tinha definido, à partida, Educação Pessoal, Moral e Cívica.
As aulas decorriam nas instalações da Biblioteca da Escola, com horários estabelecidos (cf. Anexo), com a duração prevista de uma hora/aula, (normalmente excedia o tempo regulamentar devido a vontade e interesse de continuar na aula, tanto das crianças como das professoras), com prévia preparação do ambiente/clima respeitante ao tema a ser trabalhado. A preparação para cada aula começava à entrada ao perceberem um ambiente diferenciado, acolhedor, inusitado e de constantes surpresas.
Na máxima “Quando me movo, o Universo se move”, assim essas aulas foram concretizadas. Todas as turmas, tinham uma aula de E.P.M.C., por semana. As aulas eram planificadas em detalhes, com três momentos distintos, apresentação/introdução do tema, desenvolvimento/dinâmica do tema, conclusão/síntese e propostas de continuidade do tema que naturalmente transcendia para a transversalidade das outras áreas disciplinares em sala de aula.
Aqui, cabe dizer que a primeira superação a que me submeti e confesso ter sido para mim a mais difícil e temida foi ter o professor ou professores (incluia Professores de Apoio e do Ensino Especial) a assistirem as aulas, em carácter de acompanhantes da sua turma e, o mais importante como agentes fundamentais no continuun das aprendizagens das crianças, tendo da minha parte como objectivo a participação activa na formação sobre os valores na prática pedagógica diária desses professores. Cada sessão era pensada minuciosamente para atingir o seu objectivo funcional (trabalhar o tema) mas sem deixar de visualizar a meta a alcançar com as crianças e com os professores, acreditando que “estimular e apoiar no íntimo da criança uma teia de vínculos, deve ser a primordial tarefa do educador” (Pires, 2007), (...)“são os vínculos que lhe dão as raízes que o ligam ao solo da realidade e lhe permitem alcançar a plenitude da vida...lhe oferecem segurança existencial e energia vital e configuram o seu organismo de vinculações (Strada, 1991). Segundo Kentenich (1983) define vinculação como sendo um “acolhimento afectivo”. As aulas de E.P.M.C. só obtiveram pleno sucesso pelo “acolhimento afectivo” que se estabeleceu na reciprocidade dos afectos entre os intervenientes.
Retomando a questão da auto-superação. Não foi uma missão nada fácil, mas indubitávelmente desafiadora e estimulante, “o expor-se perante si próprio e perante os outros pode desencadear um sentimento de risco” (Freidus, 1998). Estar a desempenhar o meu papel perante julgamentos e possíveis críticas, num engenho nada convencional, numa dinâmica inovadora e ambiciosa de não só contribuir para mudar procedimentos tradicionais, de estatuto classista convencional e muitos deles “cristalizados”, aliada a falta de à vontade de ministrar uma aula na presença de pessoas “estranhas” adultas, tornou esse projecto numa verdadeira façanha.
Porém, o objectivo a alcançar era mais forte e superior a qualquer obstáculo de percurso. Confesso que as primeiras aulas e demais intervenções nos outros domínios do projecto levaram muitas horas do meu sono, suor, horas de preparação e pesquisa.
Compactuo com a afirmação de que “o educador progressista precisa estar convencido como de suas consequências é o de ser o seu trabalho uma especificidade humana. Nada que diga respeito ao ser humano, à possibilidade de seu aperfeiçoamento físico e moral, de sua inteligência sendo produzida e desafiada, os obstáculos a seu crescimento, o que possa fazer em favor da boniteza do mundo como de seu enfeamento, a dominação a que esteja sujeito, a liberdade por que deve lutar, nada que diga respeito aos homens e às mulheres pode passar despercebido pelo educador progressista. Não importa com que faixa etária trabalhe o educador. O nosso é um trabalho realizado com gente, miúda, jovem ou adulta, mas gente em permanente processo de busca. Gente formando-se, mudando, crescendo, reorientando-se, melhorando” (Freire, 2006).
Com a firme convicção de missão a cumprir, assumi o papel a que me propus no exercício das funções pedagógicas, superando minhas limitações diariamente numa performance valorizada de maior domínio em público, controle da tímidez e alguma insegurança. Deixou-me a certeza de que não importa o grau de dificuldade inerente a determinada situação, mas sim a importância do objectivo a alcançar e a determinação imposta a nós mesmos.
As aulas de E.P.M.C., o Centro de Recursos, a Assembléia de Alunos, a gestão de conflitos, o Apoio Individualizado e encaminhamento de alunos com problemas de Saúde, Familiar, Disciplinar, o envolvimentos nos eventos, comemorações, visitas de entidades e profissionais à escola, Projectos diversos, elaboração de documentos, edição de um livro para ser entregue ao Senhor Bispo de Braga aquando da sua visita a Escola, a participação na elaboração do Regulamento da Assembleia de Alunos e outros trabalhos referentes ao Projecto constituiram até hoje elementos de mais-valia para toda a comunidade escolar, sem deixar de ter sido, pessoal e profissionalmente, uma gratificante aprendizagem de vida.
Esse Projecto deixou de existir quando o Sistema de Gestão das Escolas foi reformulado e a escola passou a funcionar como Agrupamento Vertical, sendo extinto o cargo de Assessora, ao qual eu estava a exercer e me proporcionava condições para trabalhar nesse projecto. Até hoje, penso que foi uma perda significativa para a escola. Não só pelo que aprendi com esta experiência, mas pelos benefícios que este Projecto proporcionou à comunidade educativa.
Esse trabalho, reconhecido pela Escola e pela Presidente do Conselho Executivo, teve Louvor nº 221/2003, publicado no Diário da República de 01/Set/2003, Apêndice nº 133 – II Série – nº 201.

O Milagre da Vida

(...) Pode ser que um dia não existamos...
Mas, se ainda sobrar amizade,
Nasceremos de novo, um para o outro.


(...) Há duas formas para viver a sua vida:
Uma é acreditar que não existe milagre.
A outra é acreditar que todas as coisas são um milagre.

Albert Einstein (1879-1955)

Mudança para Portugal: retorno aos estudos e as salas de aula

A mudança de país implicou uma tomada de atitude marcante na minha vida.
Para desenvolver a função docente, submeti-me a provas de equivalência de estudos do Ministério da Educação. Foi submetida, pelo Ministério da Educação a uma escolha para mim muito difícil, a fazer a opção pelo Curso de Educadora de Infância ou pelo Magistério Primário. Ambos constituem, a meu ver um percurso, não havendo discrepâncias, pelo contrário, apenas mais valia. Mas a “escolha” me cabia fazer. Optei mais pela razão, ao perceber que teria mais vagas no Ensino Básico.
Fase de transição. As escolas de Magistério estavam a fechar. Mudança para os Institutos Superiores de Educação. A única, na altura ,em funcionamento era em Coimbra. Foi marcada a data das provas.
Muita bibliografia e estudo. Provas feitas, liguei para a Escola para saber as notas. Compensação pelo esforço, dezoito em todas. Ao obter a equivalência ao Curso do Magistério Primário, média de dezasseis. Nunca soube a razão pelo rebaixamento das notas das provas oficiais. Se fizessem a média das Provas pela do diploma seria de dezoito. Mas aprendi a valorizar a minha nota ao constatar que tinha uma boa média para o sistema vigente na altura. Realmente, nem completei um ano como contratada apenas pela média, única e exclusivamente, pois não foi contado o tempo de serviço no Brasil.
Julgava então, ter ultrapassado a fase de estar numa sala de aula e sentia-me com capacidade e vontade de assumir cargos de direcção, visto que tirei uma licenciatura em Pedagogia para efeito de carreira, além de pós-graduação em Administração Escolar e Supervisão Escolar e desempenhado o cargo de directora de escola no Brasil. Ao ter que voltar a dar aulas, a sensação que tive foi de retrocesso, de ter reiniciado a carreira depois de ter vivido de forma tão intensa tantas experiências.
Porém, reconheço que as experiências que tive, nas várias escolas que deixei meu cunho pessoal serviram-me como aprendizagem acrescida. Cada escola, cada aluno (em especial, aqueles que mais necessitavam) somaram valores pessoais, profissionais e humanos a minha carreira. Aprendi com o Manuel que tanta resistência física, emocional, psíquica exigiu de mim, no exercício mais puro da perseverança (Marques,2002). Soube, à posteriori que essa turma, no ano que leccionei constituída de 24 alunos de 3º Ano, ficou reduzida a 14 alunos no ano seguinte, com a mudança de três professores devido a dificuldade de lidar com o Manuel. Os professores não tendo condições para superar os graves problemas psíquicos do referido aluno, provocou também a reacção dos pais, que ao verem os seus filhos prejudicados pela instabilidade, passaram a pedir transferência para outras escolas. Nesse dia, percebi o quanto eu fora importante para o Manuel e para a turma. Percebi, claramente o quanto aprendi naqueles momentos de total descompensação do aluno e como superava esse dilema. Sabia que os métodos severos anteriormente utilizados não condiziam como o meu procedimento deontológico e pedagógico, porém passara a ser a forma pela qual o aluno fora “habituado” a processar a falta de controle. Passava por um teste emocional diário.
“Gosto de ser gente porque, como tal, percebo afinal que a construção de minha presença no mundo, não se faz no isolamento”(...)(Freire, 2006).
Também o António, da Escola das Caxinas, aluno que no 1º Ano evidenciava comportamento de um bebé com acessos de descontrole total, falta de coordenação motora até mesmo para estar sentado. Nessa experiência, aprendi a ter que conviver com uma mãe que não aceitava os problemas do filho. A dificuldade de encaminhamento à psicóloga da escola, levou-me a ter que fazer várias reuniões para vencer “a barreira” da mãe, a auto-ajudar-se e ao filho. Tantos outros Manuéis e Antónios passaram nesta trajectória, coube um tempo de vida para cada um deles. Ficou, porém, a certeza de missão cumprida.
Retomo à razão principal pela qual, a essa altura da minha vida pessoal e profissional, ansiava por uma experiência que me proporcionasse a oportunidade de abranger um maior número de crianças para além de grupo/turma, operacionalizar o meu saber-fazer postulado pela vivência de anos a trabalhar numa base da pedagogia de vinculações (Kentenich) que acredita que “a vinculação é essencialmente uma relação afectiva, da qual enfatiza a intervenção na construção da personalidade. É aí que a segurança intervém. Aquele a quem, precocemente, é oferecida a possibilidade de construir uma rede de vinculações fundamentais, desenvolve, provavelmente, uma personalidade segura e emocionalmente equilibrada” (Pires, 2007).

O Ir e o Voltar

Percepciono a minha vida como numa caminhada de dois sentidos onde ora estou de um lado do Oceano ora estou do outro, a saga começou com o meu bisavô materno. Deu continuidade com os meus pais, depois fui eu e agora são os meus filhos. Somos concomitantemente de dois países, de cada qual nos apelidam com o nome do outro e afinal somamos mais valias... temos oportunidades de ter “every waking and some nonwaking moments”(Schulman,1998), inerentes a toda história de vida que nos diferencia como seres únicos e especiais.

A Experiência na Formação de Professores: vivência de um contexto sócio-cultural atípico

Seguindo o paradigma da mudança, da experienciação em contextos diferenciados da educação e na “aposta” das minhas capacidades, aceitei o convite da directora de escola, na qual exercia funções docentes no Ensino Básico, para ministrar aulas de Psicologia do Desenvolvimento da Criança e de História da Educação para as turmas de primeiro e segundos anos do Curso de Magistério Primário. Atendendo que a minha Licenciatura Plena em Pedagogia me habilita a docência de todas as disciplinas pedagógicas, e pela relação de confiança, credibilidade e profissionalismo que estabeleci com a Darci, então Directora Efectiva da Escola.

Um pequeno desvio, em carácter de esclarecimento

Nesse tempo, viajava uma média de 160 Km por dia, ida e volta para trabalhar numa escola isolada, de “sítio” que distava aproximadamente 30Km da cidade de Nazaré Paulista, local da escola-sede. Os alunos todos oriundos da zona rural, desconheciam a cidade e o “mundo” para eles se restringia aos limites geográficos do “sítio”(herdade). Os pais, “caboclos”, pessoas simples, acostumados a lida do campo e principalmente na criação de gado leiteiro. No meio do “sítio”, havia a igreja e a escola. Uma única sala de aula e uma pequeno hall de entrada onde se preparava a merenda diária.
A escola pertencia ao segundo plano. Em primeiro lugar vinha a igreja. Dividiamos o espaço físico, mas não o estatuto. A escola era para frequentar quando não houvesse nada mais importante para fazer no trabalho. No primeiro dia convoquei os pais. A sala estava cheia de homens com semblantes marcados pela exposição constante ao sol, pelo trabalho pesado e pelas agruras da vida. Olhares desconfiados. Estavam habituados a ver um professor chegar e logo em seguida aparecer de vez em quando, ou até mesmo nem aparecer mais. Comecei a falar e a minha franqueza foi deixando a ar mais leve. De imediato, tudo mudou, por trás daquelas figuras rudes, de “cangaceiros do sertão” haviam pessoas simples, de falar manso com uma pronúncia enrolada, de erres brandos(à francesa), dispostos a fazer qualquer sacríficio para dar o seu apoio a professora, que afinal mal acabavam de conhecer. Nesse dia, convenci-me que possuia o dom da palavra e mais importante ainda foi sentir que havia conquistado aquela comunidade. Prometeram-me que as crianças não faltariam mais à escola e ofereceram os seus préstimos para o que fosse necessário. Nunca hei de me esquecer desse dia. Faz parte da minha história. A escola funcionou o ano inteiro. Com chuva ou sol diariamente fazia aquele caminho, de auto-estrada e depois de terra batida a serpentear o morro. Os cavalos e as charretes me acompanhavam nos dias de chuva. Fizemos uma horta cercada de cipó e taquaras. Conseguimos dar duas refeições diárias decentes. Consegui levar medicação para as crianças, que tinham berne na cabeça, por lidarem com o gado. O gado era tratado por veterinários e as crianças não. Por todo esse meu envolvimento nessa escola, fiquei muito amiga da directora da escola-sede e foi assim que surgiu o convite para ministrar as aulas no Magistério Primário a funcionar no horário nocturno nessa Escola.
Depois desse interlúdio para contextualizar a situação, posso acrescentar que, ao fazer uma retrospectiva temporal, espanto-me com a capacidade que tinha de conseguir fazer tantas coisas num só dia. Viajava de autocarro, andava a pé uma meia hora até chegar a escola. Preparava as aulas à noite. Mas agora vem a parte mais interessante deste episódio.
Na cidade havia apenas essa escola e o curso de Magistério Primário era o único curso que a escola podia oferecer àqueles que não pudessem ir para a cidade mais próxima. As turmas estavam constituídas por jovens e por adultos de todas as idades, de ambos os sexos, e que iam desde uma costureira com cinquenta e tal anos que sonhava ser professora até um senhor sexagenário que depois de aposentado resolveu estudar “(...)para ter acesso a uma melhor qualidade de vida devemos melhorar os nossos conhecimentos”(Geremek). Essa “amálgama” de projectos com características tão diversa e rica, fez com que eu, uma jovem profissional, tivesse um estatuto de tão alto nível entre todos. As aulas eram estruturadas por temas de interesse, eu entrava com a teoria e os alunos com a experiência, a prática, a realidade da vida de cada um. Aprendi muito. Aprendi a dar ainda mais valor a “cultura” que cada ser humano carrega em si mesmo.
Na altura pensava no bem dos alunos, pois seria difícil encontrarem outro docente que aceitasse essas aulas, a ganhar tão pouco e a ter que fazer tantos sacrifícios mas hoje vejo que reverteram em aprendizagem de vida para mim e regojizo-me com isso.

Ensinar uma arte e uma ciência

“A forte relação estabelecida entre professor e aluno constitui o cerne do processo pedagógico”(Jacques Delors)

Pós – Graduação em Supervisão Escolar: Um Contributo ao Ensino

Na constante necessidade de conhecimento, de dar continuidade a trajectória que a mim mesma me impus, avancei para atingir mais um grau de complementaridade na minha formação.
Se a Direcção de Escola me daria a possibilidade de contribuir com os meus préstimos profissionais para um estabelecimento de ensino, com a Supervisão Escolar ampliaria essa possibilidade abrangendo várias escolas. Mais uma vez me lancei nessa empreitada. São Paulo era agora o “filão de ouro”. A faculdade que oferecia esse curso pós-laboral estava, novamente, distante geograficamente da minha cidade. Mas nada me impediria de tentar atingir o meu objectivo. A experiência anterior da licenciatura aprendi que se tentasse ir sózinha, inviabilizaria o projecto. Comecei então, a angariar pretensas candidatas a fazer a pós-graduação em São Paulo. Muitas indecisas, muitas desacreditadas na educação, muitas sem condições económicas para o fazer, até que consegui convencer mais três resistentes. A lotação de um veículo, o ideal para nos aguentarmos. Viagens directas. Com muito esforço, coragem e união superamos os piores momentos.
O curso, embora intensivo, aula a aula enriquecia-me. Professores experientes aliavam a teoria à prática desafiando-me. Constituia, indubitávelmente uma contribuição para o devir.

A “eterna” busca do saber

Para mim, “na formação permanente dos professores, o momento fundamental é o da reflexão crítica sobre a prática. É pensando criticamente a prática de hoje ou de ontem que se pode melhorar a próxima prática. O próprio discurso teórico, necessário à reflexão crítica, tem de ser de tal modo concreto que quase se confunda com a prática.(...) quanto mais me assumo como estou sendo e percebo a ou as razões de ser de porque estou sendo assim, mais me torno capaz de mudar, de promover-me, no caso, do estado de curiosidade ingênua para o de curiosidade epistemológica”(Freire, 2006).

Licenciatura em Pedagogia com Administração Escolar: Meta de Ascensão Escolar

Cedo percebi que mais poderia contribuir para o ensino se pudesse atingir uma condição de progressão profissional.
Estar numa sala de aula, teve seu sentido numa fase. Mas almejava muito mais. O meu horizonte se estendia á medida que eu avançava. Nunca houve dúvida ou hesitação.
Avancei para a licenciatura em Pedagogia com Administração Escolar com a certeza de que esta me traria condições para atingir a minha meta – estar a frente de uma escola “numa perspectiva progressista”. (...) como aventureira responsável, predisposta à mudança, à aceitação do diferente. (...) Nada do que experimentei em minha actividade docente deve necessariamente repetir-se. Repito, porém, como inevitável, a franquia de mim mesma, radical, diante dos outros e do mundo. Minha franquia ante os outros e o mundo mesmo e a maneira radical como me experimento enquanto ser cultural, histórico, inacabado e consciente do inacabamento” (Freire, 2006).
A superação de obstáculos como a distância da faculdade, a indisponibilidade de tempo, um filho pequeno para criar, grávida do segundo filho, regresso à casa de madrugada, exposta a perigos diversos na estrada, condição financeira para suportar despesas de faculdade e transporte me tornaram mais forte, resistente a transpor qualquer dificuldade.
Nesse tempo, aprendi a dar mais valor a força colectiva de um grupo que almeja um objectivo comum. As resistentes, assim nos tornamos. Cada elemento do grupo constituía um elo de força, que unidos davam a possibilidade de continuar, mas separadas jamais teríamos conseguido. A união, persistência, espírito de entre-ajuda, encorajamento nos momentos de desânimo, a doacção de conhecimentos, colaboração e companheirismo fizeram com que esse curso estreitasse amizades que persistem no tempo.
Afinal a minha meta foi atingida. Estava licenciada. A colação de grau foi para mim a constatação de uma vitória. A vitória de não ter sucumbido perante tantos obstáculos. Trazia acoplada a vontade férrea de avançar, de progredir, de contribuir para a educação.

A Historicidade do saber

Respeitando a historicidade do saber, o carácter histórico da curiosidade, assumi a “humildade crítica, própria da posição verdadeiramente científica”(Freire,2006) e tomei avanço na trilha do conhecimento.

Uma Prova de Confiança: Directora de Escola

Ainda a frequentar o quarto ano do Magistério com Especialização na Àrea da Pré-Escola, eleita Directora de Turma por evidenciar propensão para a liderança, assiduidade e devoção pelo cumprimento dos meus deveres, fui convidada pela Professora de Psicologia a dar aulas de estágio numa escola situada num bairro da zona rural de Atibaia.
Fiquei honrada pelo convite, mais não fosse por ter vindo da professora que eu tanto admirava. Assim, passei a ser chamada com frequência para substituir os professores que faltavam. A Directora da Escola passava na minha casa para me levar até a escola, quase todos os dias. Tornamo-nos amigas. O respeito, a confiança e o alto profissionalismo nos aproximava. Ela exortava princípios de “autoridade que uma parte dos alunos resiste a elas e os pais não esperam mais que o professor exerça uma autoridade à qual eles mesmos renunciaram”(Perrenoud, 2007). Essa vertente era compensada pela minha pedagogia de vertente cognitivista e humanista, com ênfase na interacção, sentimentos e valores. Estabelecemos uma relação simbiotica de confiança. À tal ponto que, tendo necessidade de tirar uma licença de três meses, indicou o meu nome para a delegada escolar como sendo a única professora capaz, de sua inteira confiança, a assumir o cargo de directora da escola na sua ausência.
Claro está que a situação provocou constrangimentos com os pares. Fiquei surpresa quando fui convocada pessoalmente pela delegada de ensino para assumir o cargo de direcção interino. Nada poderia fazer, a não ser aceitar. Sabendo que estava a ter uma oportunidade de desenvolver o meu trabalho e fazer juz a tanta confiança.
A transparência de procedimentos, envolvimento com os pais como parceiros, a colaboração e confiança mútua reverteu em benefícios para todos. A escola passou a ter condições de oferecer àqueles alunos um ensino de qualidade.
O Clube Cívico da Escola administrado por uma comissão de alunos com estatutos e regulamentos próprios, desenvolvia trabalhos conjuntos com a direcção. Uma vez por semana, à sexta-feira havia apresentação de actividades pelos alunos. A responsabilidade cívica e o prazer pelo desempenho de funções compartilhadas com a direcção da escola contribuiram de forma irrefutável e significativa para o sucesso escolar, sem deixar de referir o agradável ambiente de escola.
Através da constituição de uma Comissão de Pais, a comunidade sensibilizou-se para a importância da educação e frequência às aulas com nítida diminuição do absentismo, capacidade de oferecer uma alimentação equilibrada com fartura de produtos hortigranjeiros oferecidos pelos agricultores da região, produção de produtos artesanais (geléias e compotas de frutas) para arrecadação de fundos orçamentais para a escola. A escola estava inserida numa zona de grande produção de morangos e de flores (crisântemos) para exportação.
Reflexão na acção (Schon, 1983). A maior recompensa foi a participação activa da comunidade na preparação de uma das festas mais espectáculares que até hoje jamais vi, com a presença da delegada de ensino e a directora efectiva da escola. A escola foi decorada com crisântemos pelos produtores da região. Esse episódio veio confirmar a premissa maior da qual nunca deixei de acreditar, que o ensino passa pela crença do homem no homem.

Educação para todos

Sem educação “o povo continuaria na caverna, de costas para a luz, acorrentado a um meio jogo móvel de sombras, sem saber que, fora dela, brilha a verdade”( in Platão, Santos).

Primeiros Passos na profissão pelas “mãos” de Piaget

O início da minha profissão como Educadora de Infância na Escola Municipal de Educação Infantil “Maria José Maia de Toledo”, integrada na Rede Municipal de Atibaia, com reconhecido mérito de qualidade no Estado de São Paulo e em Brasília deu-nos o acesso ao Programa de Educação Pré-Escolar da Faculdade de Educação – Departamento de Psicologia Educacional – UNICAMP(1995).
Através desse projecto de Formação de Recursos Humanos para a Educação Pré-Escolar, com a duração de dois anos, aprendi a conhecer a teoria piagetiana e a saber aplicá-la na prática em sala de aula (Furth). Há dois compêndios resultantes desse curso que carrego comigo até hoje.
Penso que há muitas distorções da teoria piagetiana, difundidas pelas vagas de modismos que a julgam ultrapassada. Arrisco-me a afirmar que a validade da teoria se faz actual sabendo dosá-la na medida adequada.
Essa experiência envolveu a convergência de papéis na implantação do Programa, trazendo assim uma mais valia pela unicidade de procedimentos na educação. “As crianças necessitam de pessoas para se tornarem humanas”(Bronfrenbrenner). Abrangendo o papel do professor, o papel dos pais, o papel dos administradores (director, supervisor...), o papel das Auxiliares de Educação, o Papel das outras pessoas que trabalham na escola ( a cozinheira, o jardineiro, o motorista...), a todos cabe uma parcela de contributo na educação. Erroneamente, imputam ao professor a responsabilidade da educação da criança. Há todo um conjunto de pessoas que devem ter formação para uniformizar procedimentos de modo a viabilizador o sucesso do ensino-aprendizagem.
Na teoria piagetiana, que trabalhei durante seis anos, envolvida no Projecto de Educação Pré-Escolar (PROEPRE) aprendi que, no processo de aprendizagem há que adicionar a uma estrutura cognitiva um novo elemento e esse vai ser assimilado num processo de reestruturação, de “remexer” em estruturas adquiridas perante o novo dado assimilado e processar a acomodação dessa aprendizagem que consecutivamente refaz o procedimento. Esse processo cognitivo dinâmico de razão/emoção é consciente no meu quotidiano.

Piaget: Interaccionista relativista

“A Educação é, por conseguinte, não apenas uma formação mas uma condição formadora necessária ao próprio desenvolvimento natural. Proclamar que toda pessoa humana tem direito à educação não é pois unicamente sugerir, tal como o supõe a psicologia individualista tributária do senso comum, que todo indivíduo, garantido por sua natureza psicobiológica ao atingir um nível de desenvolvimento já elevado, possui além disso o direito de receber da sociedade a iniciação às tradições culturais e morais; é, pelo contrário e muito mais aprofundadamente, afirmar que o indivíduo não poderia adquirir suas estruturas mentais mais essenciais sem uma contribuição exterior, a exigir um certo meio social de formação, e que em todos os níveis (desde os mais elementares até os mais altos) o factor social ou educativo constitui uma condição do desenvolvimento” (Piaget, 1973:39).

A Marca de uma autora: Helen Bee

A experiência passa por em 1981, ano de conclusão do meu curso de Magistério Primário com Especialização na Área da Pré-Escola, ano em que surge o primeiro Concurso Municipal Público de Provas, com a possibilidade de inscrição aos recém-formados, ao qual me inscrevi. Dentre a bibliografia aconselhada para a prova escrita, constava um livro que guardo desde a época (e não foi fácil, pois para além dos anos passados, mudei não só de país como também de cidades e casas várias vezes) com um carinho especial, sendo essa obra uma das referências citadas nesse concurso, não será preciso dizer que estudei de trás para frente e vice-versa.
Esse livro, hoje já amarelado pelo tempo, que não conseguiu resistir colado a capa que plastifiquei para não estragar, foi este ano, passados vinte e sete anos, mencionado pela professora da Unidade Curricular de Pedagogia da Educação de Adultos, no curso de Mestrado de Educação e Sociedade que frequento. Este livro é de Helen Bee. A minha ligação com a obra “A Criança em Desenvolvimento (1977), remete a um passado significativo na minha vida pessoal e profissional. Profissional porque foi a “pedra” inicial na construção da minha carreira e esse livro constituiu uma mais valia na conquista de um segundo lugar na classificação final do concurso, entre cerca de quinhentos candidatos. Pessoal porque imagens semelhantes ao desenrolar da fita de um filme são evocadas da minha memória quando na época com dois filhos pequenos (um de cinco anos e outro de um ano) e uma vida de muita labuta, procurava conciliar o estudo com os papéis de mãe, de empresária (tinha comércios) e estudante. Os livros andavam comigo por onde fosse, adormecia e acordava com eles ao lado, mesmo com o filho ao colo.
Imagens recordadas com um misto de emoções. Quando a professora referiu Helen Bee, depois de tantos anos sem ouvir mencionar essa autora, senti-me emocionada, alegre, rejuvenescida por voltar ao passado através de uma autora, outrora importante num dado momento da minha vida. A vinculação passa também pelo “acolhimento afectivo com pessoa, local, comunidade” (Kentenich, 1983).
Passados todos estes anos recordo com satisfação, a minha reacção ao ver meu nome afixado nos editais da cidade e ao ser publicado na edição semanal do Jornal “O Atibaiense”, de acordo com os trâmites legais vigentes, em carácter democrático da política educativa. De referir que, os anteriores autarcas preenchiam as vagas de Educadoras de Infância, nas Escolas Municipais de Educação Infantil (EMEI) pela “selecção” dos conhecidos e “apadrinhados”. Assim, por conseguir um emprego por direito e mérito próprio, marcou definitivamente essa minha entrance na carreira.
Porém, o Concurso Público de Provas era constituído por duas fases, a primeira, teórica, selectiva a segunda fase prática e classificatória. Nesta última, ocorre um incidente crítico, que até hoje leva-me a reflectir sempre que haja algum episódio com algum grau de similitude.
Após a selecção de onze candidatas, estava disposto no regulamento do concurso, uma prova prática para a classificação final, perante um júri constituído por autoridades da educação, a realizar-se nas instalações da Escola Municipal “Florêncio Pires de Camargo”, a mais antiga da cidade, localizada no centro, ao lado da Câmara Municipal, em frente a minha Escola de Magistério, local onde fiz o meu estágio e fiquei amiga das educadoras. O pânico instalou-se. Como fazer para superar.
Muito jovem, inexperiente nessas andanças, perfeccionista por natureza, ser exposta a uma prova dessa natureza constituía uma dificuldade acrescida. À partida, tive que “lutar” com o nervosismo e as conhecidas consequências que tal estado habitualmente evidencia. Uma tômbola para o sorteio do tema na hora. O tempo passado é impeditivo de me lembrar se tive quinze minutos ou meia hora para preparar a aula. O tema era Educação Musical (ritmo). Recorri a algum material didáctico existente. Mas para dificultar, juntaram um grupo de alunos de quatro, cinco e seis anos de diferentes turmas. Dei início à aula, sem saber se conseguiria atingir o objectivo, dominar o grupo e, principalmente, o meu nervosismo. O tempo regulamentar, também me falha a memória da precisão. O que tenho a certeza é que não esgotei o tempo. Logo que me apercebi que já tinha realizado o objectivo, no meu entender está claro, fiz sinal se poderia acabar. A minha professora de Pedagogia argumentou que ainda havia tempo, mas decidi terminar. Em seguida, a referida professora aconselhou-me a ver aquele acontecimento como uma aprendizagem. Tinha assegurado uma boa nota, porém eu seria capaz de obter melhor performance se tivesse controlado o nervosismo e se tivesse beneficiado do tempo como um aliado.
Ainda consigo aprender ao reflectir sobre essa experiência.
Passaram-se vinte e sete anos. A sua “marca” permanece latente na minha formação. A orientação na teoria cognitivo-desenvolvimental faz parte da diversidade de perspectivas que no processo de aquisição de saberes me vejo implicada. “Quando um adulto se confronta com uma situação de aprendizagem que vai de encontro ao seu estilo de aprendizagem, aprende melhor do que quando isso não acontece” (Lovell, 1992).
Mudei!? Com certeza que sim, o suficiente para não me sentir prejudicada pelo nervosismo quando exposta em situações de comprometimento com julgamentos. Percebi notoriamente isso ao iniciar o curso de Mestrado em Educação e Sociedade. A cada aula, sentia-me excitada, por um lado pela ânsia de emitir minha opinião, troca de ideias e de saberes, por outro lado por estar a expor-me em público com domínio da situação, mesmo nas situações mais evidentes de constrangimentos como na apresentação de trabalhos, que por sinal passavam por uma fase de preparação detalhada do tema, aquisição de conhecimento, acessibilidade por parte do grupo ao conteúdo do trabalho, diversificação na dinâmica aplicada e gestão do tempo.
Lição aprendida?! Creio que a resposta satisfaz. Há a consciência de aprendizagem experiencial num processo dialéctico da experiência concreta, observação e reflexão, de formulação do conceito abstracto, generalização e a verificação da aplicação concreta a novas situações.

Helen Bee, o encontro e o reencontro

Consta no prefácio do livro de Helen Bee “(...) torná-lo tão humano quanto possível, de forma que o estudante sentisse que uma pessoa real estivesse falando consigo. O livro é na primeira pessoa porque ele é um livro de mim para você” nesta frase sente-se a intimidade com alguém que não conhecemos, mas que se torna íntima pela vontade de se dar, pela pessoalidade impressa nas suas páginas.

A trajectória de uma missionária do ensino

O facto de iniciar este portfólio a escrever sobre valores dou início a uma “viagem com paradas em alguns apeadeiros” (Chaves,2005), passando pela vontade de referir a vertente de missionária da educação que postulo na minha prática docente.
Tal como é fundamental para mim, a consciência existencial, seus princípios e valores, felizmente a profissão de educadora/professora me proporciona a possibilidade de trabalhar com seres humanos em formação. Assim desde o meu primeiro dia de leccionação, mesmo que esteja um único dia com as crianças, para mim o principal consubstancia-se pela interacção, a empatia, a vivência dos valores, a “eternidade” daquele momento.
Poderia referenciar cada aluno, pela grandiosidade da sua especificidade como ser humano, que passa pelo facto de ter a sensação de aprendizagem constante no dia-a-dia com os meus alunos e pelo habitus reflexivo como filosofia de vida.
Para enquadramento do meu percurso, passo a narrar um breve histórico profissional.
No Brasil, antes mesmo de terminar o curso, leccionei em carácter de estágio docente em duas escolas públicas de Ensino Básico e Secundário. Cedo aprendi a merecer o respeito dos colegas (veteranos), directores e delegada de ensino.
Exerci a função de Educadora de Infância durante seis anos, concomitantemente leccionei no Ensino Básico perfazendo um total de dez anos, leccionei como Professora do Magistério Primário de 1º e 2º Ano, Vice- Directora e Directora de Escolas de 1º e 2º Graus. Vim para Portugal onde desde 1991 desempenho funções docentes no Ensino Básico, Assessora do Conselho Executivo (dois anos) e coordenadora de Escola (dois anos).
Num percurso profissional de total empenhamento nos princípios e dogmas próprios de uma filosofia de ensino fundamentada no ser humano, no seu potencial, capacidades e necessidades relacional, social, moral, cívica, dialógica (Freire, 2006) conduzo a minha prática docente.

A trajectória de uma missionária da educação

“Uma vez que um dos maiores problemas da sociedade actual se situa em questões afectivas profundas que afectam, de forma determinante, o desenvolvimento e a educação de tantas das nossas crianças e dos nossos jovens, a solução deveria passar por um tipo de pedagogia em que a componente afectiva seja relevante, enquadrando todos os outros aspectos, cognitivos, sociais e de construção de valores”(Pires, 2007).

Dar-me a conhecer: a minha filosofia de vida

Ao ter que fazer um portfólio, intuí que deveria começar com algumas ideias dos grandes pedagogos da história. A sabedoria e o conhecimento transmitidos por esses homens intemporais sempre exerceram sobre mim um verdadeiro fascínio.
Só “Sei que nada sei”, a cada dia surpreendo-me com um admirável mundo desconhecido. O mundo interior do ser humano, aquele que não é conhecido, que surpreende, que fascina por si mesmo.
A busca incessante de conhecimentos, a necessidade premente de questionar, a procura de respostas para as situações a que me deparo no quotidiano, a tentativa de compreensão à luz da razão e do coração fazem parte intrínseca da minha existência. E, é nessa complexidade que me “reconheço como arquitecta da minha própria práctica cognoscitiva” (Freire, 2006).
A minha existência coexiste pelo paradigma do “Bem como valor supremo” (Platão), na relação de “...valores sensíveis e espirituais. Os espirituais incluem os hedonísticos e os vitais. Os espirituais incluem, por ordem crescente de importância, os estéticos, os éticos, os lógicos e os religiosos” (Scheler) como filosofia de vida pessoal e profissional.
Nessa perspectiva reflexiva de posicionamento de captação dos valores e consequente vivência, refiro os sentimentos (Scheler, Hartmann e Cabanas) como “ignição” para a formação da personalidade de todo o indivíduo.
Não consigo resistir à vontade de referir a teoria de Platão, que parte do princípio que “a virtude não é uma ciência ou, por outras palavras, que a moralidade não assenta em princípios, no conhecimento de um ideal e das razões supremas da acção (...) O conhecimento do Bem, na verdade, o conhecimento das finalidades que devem dirigir a conduta não é assimilável ao conhecimento dos objectos. Este é constituído por relações entre os termos exteriores ao indivíduo e em nada influi na sua vontade: o conhecimento de uma regra matemática ou gramatical não determina directa e imediatamente a acção; aplicá-la-ei se quiser e quando quiser. Mas o conhecimento do Bem implica contrário uma relação entre o indivíduo e a sua actividade; somente existe bem e mal para um sujeito activo que deseja e quer; o conhecimento de um bem não se resume unicamente na representação de um objecto, mas é a consciência de um valor” (Chateau).
Como também de mencionar, “os métodos da educação socrática que derivam desta interioridade do saber autêntico...” se formos instruídos por esse processo, seremos capazes de conhecer outras verdades que não as das ciências exactas e empíricas, uma outra verdade que não a dos objectos exteriores, mas a que constitui o objectivo da ciência do Bem, a verdade dos valores” (Ibidem).
Ao que acrescento a referência ao esquema educativo de Protágoras: “a educação moral encontra o seu verdadeiro fundamento na reflexão sobre as condições da objectividade e na exigência da autonomia espiritual; a virtude pode ser ensinada, porque se resume a uma ciência; a moralidade assenta num conhecimento objectivo dos valores” (Ibidem).
Muito cedo em minha vida, descobri que há muito mais para além do mero “conhecido”, material, aparente. Que o ser humano carrega em si um potencial infinito, imensurável.
Os homens sábios superam essa barreira da horizontalidade e transcendem, vivem no cruzamento da verdade horizontal e da vertical. Nesse ponto de intercessão (no simbolismo da cruz) conseguem viver aqui (na linha horizontal da vida do dia-a-dia) e na transcendencia da essência, da alma (na verticalidade da conexão com as virtudes universais).
Nesse preâmbulo, dou-me a conhecer um pouco. Para mim o processo de aprendizagem é constante. A construção do conhecimento, seja formal, informal ou não formal constitui a razão da minha existência. As experiências, cada vivência, “desconstrói” e constrói-me a cada momento.

Caracterizo-me acima de tudo por SER

Ser um Ser Humano que reconhece “ o princípio de pessoalidade como fundamento básico a pessoa de cada indivíduo em formação com todas as flutuações que o ser/devir pessoa pressupõe (...) na relação professor-aluno ou formador-formando, num processo de compromisso mútuo com os valores que sustentam e garantem os direitos universais. Por outro lado, assumindo a aprendizagem, enquanto construção de conhecimento e condição de formação, no sentido mais abrangente deste conceito, de matriz reflexiva, de auto- implicação na própria aprendizagem e a mais-valia do Outro como elemento enriquecedor (Chaves, 2005).

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Reflexões

Tudo começou há muitos anos atrás...

Uma menina de cabelos encaracolados, olhinhos de esperança. As brincadeiras com a boneca "Susi" e a "Wanderléia" aconteciam em parceria com o atendimento aos fregueses do "armazém" e com a administração do "negócio". Falava como gente grande com o gerente do banco "de igual para igual" ciente da sua responsabilidade. Convencida de que tinha muito a fazer, a viver. Sonhava... idealizava o futuro...
Sem irmãos, sempre muito sozinha, tinha um grande amigo e confidente - Jesus.
Foi com Ele que ela contou sempre... contou e sonhou um futuro feliz para ela e sua inseparável mãe - a "Zisa".

Aos quatorze anos, acontece a sua segunda travessia do Oceano Atlântico. O que estaria p'ra além mar?! A saga continuava. Começara nos anos cinquenta com a ida de seus pais para o Brasil. Bem antes fora seu avô materno. Nunca mais ninguém soube de seu paradeiro. Constituiu família em algures por lá.

Aos dezoito anos, numa bela capela, em Coimbra, realiza-se o casamento da jovem-menina. Desde sempre, percebeu o significado de "estrangeira". No Brasil, filha de pais portugueses. Em Portugal, a brasileira. Aprendeu a gostar de ser diferente.

Depois de cinco anos por cá, regressa ao Brasil mais rica. Levava ao colo um tesouro de sete meses de idade que veio do céu, foi gerado no seu ventre, nascido pelo amor. Mais uma vez foi uma guerreira. Teve seu filho aparado pela vida.

Tempo de procuras. O que fazer? Juntas elas foram. Não mais duas: mãe e filha. Agora eram três. O pai do coração esperava por eles. Sempre soube -até promessa ele fez para Nossa Senhora Aparecida - que "sua filha" voltaria.

Atibaia foi a eleita. Uma cidade interiorana, uma estância climática. "O paraíso quase perfeito na Terra" diz o slogan.

A menina-mulher trabalhou, estudou e criou os seus filhos. Nasceram dois lindos seres de Luz! Atibaianos-de-gema.

Acredita que a sua missão é a educação. Faz o Magistério Primário com Especialização na Área da Pré-Escola. Aulas de substituição nas escolas. Passa no concurso da Prefeitura de Atibaia e começa a trabalhar na EMEI Maria José Maia de Toledo. Continua a estudar e tira a licenciatura em Pedagogia com Administração Escolar. Vai para São Paulo tirar uma pós-graduação em Supervisão Escolar.
Passa no concurso de Professora do Estado de São Paulo. É colocada em Itaquaquecetuba. Fica a dar aulas numa escola de sítio agregada a escola de Nazaré Paulista onde dá aulas de Psicologia do Desenvolvimento e História da Educação no Magistério Primário. Única opção aos alunos daquela região.

O dia começava cedo, ao raiar do sol e acabava muito tarde. Muitas vezes adentrava pela madrugada a brincar com os filhos que trocara o dia pela noite.