"Saber que ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua própria produção ou a sua construção".
Pensar certo - e saber que ensinar não é transferir conhecimento é fundamentalmente pensar certo - é uma postura exigente, difícil, às vezes penosa, que temos de assumir diante dos outros e com os outros, em face do mundo e dos fatos, ante nós mesmos. É difícil, não porque pensar certo seja forma própria de pensar de santos e de anjos e a que nós arrogantemente aspirássemos. E difícil, entre outras coisas, pela vigilância constante que temos de exercer sobre nós próprios para evitar os simplismos, as facilidades, as incoerências grosseiras.
É cansativo, por exemplo, viver a humildade, condição "sine qua" do pensar certo, que nos faz proclamar o nosso próprio equívoco, que nos faz reconhecer e anunciar a superação que sofremos.
O clima do pensar certo não tem nada que ver com o das fórmulas preestabelecidas, mas seria a negação do pensar certo se pretendêssemos forjá-lo na atmosfera da licenciosidade ou do espontaneísmo. Sem rigorosidade metódica não há pensar certo.
"Como professor crítico, sou um 'aventureiro' responsável, predisposto à mudança, à aceitação do diferente".
Nada do que experimentei em minha atividade docente deve necessariamente repetir-se. Repito, porém, como inevitável, a franquia de mim mesmo, radical, diante dos outros e do mundo. Minha franquia ante os outros e o mundo mesmo e a maneira radical como me experimento enquanto ser cultural, histórico, inacabado e consciente do inacabamento. Onde há vida, há inacabamento.
"Ensinar exige respeito à autonomia do ser do educando".
Outro saber necessário à prática educativa é o que fala do respeito devido à autonomia do ser do educando. Como educador, devo estar constantemente advertido com relação a este respeito que implica igualmente o que devo ter por mim mesmo. O respeito à autonomia e à dignidade de cada um é um imperativo ético e não um favor que podemos ou não conceder uns aos outros.
O professor que desrespeita a curiosidade do educando, o seu gosto estético, a sua inquietude, a sua linguagem, mais precisamente, a sua sintaxe e a sua prosódia; o professor que ironiza o aluno, que o minimiza, que manda que "ele se ponha em seu lugar" ao mais tênue sinal de sua reação legítima, tanto quanto o professor que se exime do cumprimento de seu dever de propor limites à liberdade do aluno, que se furta ao dever de ensinar, de estar respeitosamente presente à experiência formadora do educando, transgride os princípios fundamentais éticos de nossa existência.
É neste sentido também que a dialogicidade verdadeira, em que os sujeitos dialógicos aprendem e crescem na diferença, sobretudo, no respeito a ela, é a forma de estar sendo coerentemente exigida por seres que, inacabados, assumindo-se como tais, se tornam radicalmente éticos.
Saber que devo respeito à autonomia do educando exige de mim uma prática em tudo coerente com este saber.
Paulo Freire, Pedagogia da Autonomia - Saberes necessários à prática educativa, 2006, Editora Paz e Terra